Claudia Dowek

Claudia Dowek, carioca, nascida em 1974; Pós-Graduada em Arte e Filosofia pela PUC-RJ e Graduada em Design Gráfico pela Faculdade da Cidade. Ingressou na Escola de Artes Visuais do Parque Lage (RJ) em 1987, onde estudou com diversos professores, entre eles Gianguido Bonfanti, Orlando Mollica, Katie van Scherpenberg, Ricardo Basbaum e Franz Manata. Além de cursos em ateliers particulares, com Bandeira de Melo, Marco Cavalcanti e workshops com os professores Richard Wilde e Jack Endewelt da New York School of Visual Arts. Seu interesse em artes a levou ainda jovem a dar aulas em escolas e comunidades, trabalhar numa Galeria e posteriormente, no Museu Nacional de Belas Artes, RJ, como assistente do então atual Curador Xico Chaves, onde se envolveu principalmente com pesquisas referentes à cultura indígena.

Trabalha no seu atelier, no Horto, Rio de Janeiro. Suas telas e objetos são criados a partir de minérios, extraídos principalmente na região de Minas Gerais, misturados a resinas, palhas e rendas garimpadas. Dessa química, resultam obras que espelham manifestações originárias nas comunidades quilombolas, caiçaras e ribeirinhas, estudadas e visitadas pela artista.

Seu trabalho atual, desenvolvido a partir de uma profunda pesquisa em antropologia cultural, discute a intercessão entre o universo rural e o urbano. Suas telas banhadas pela poética do conflito, onde a delicadeza da renda confronta a aspereza da terra, expõe as tradições esquecidas provenientes das comunidades tradicionais. Entre suas danças, musicas e artesania, a mesma mão que corta cana com um facão esculpe delicadas rendas, numa luta pela sobrevivência. A pele castigada cria uma camuflagem, onde seus limites se perdem na terra. Dentre suas múltiplas dimensões, a do tempo confunde a percepção do espectador.

 Paralelamente, seu forte caráter arquetípico nos projeta a uma dimensão quente e acolhedora, confrontando-nos com experiências pessoais. Em outro plano, uma camada onírica projeta nas sombras memórias felizes. A tela como caixa, vela e desvela entre fendas nosso Ente original.

Claudia Dowek tem quadros em coleções particulares no Brasil e no exterior.

Entre suas principais exposições:

Feira: 2013 - Artigo (RJ)

Individuais:
2013 - Centro Cultural Justiça Federal (RJ), 2011 - Galeria Colorida (Lisboa), 1999 - Solar Grandjean de Montigny (RJ), 1998 - Casa de Cultura Estácio de Sá (RJ)

Coletivas: 2013 - Salve São Jorge - EU VIRA (RJ). 2012 - ELEMENTA 5 (Centro Cultural Correios), Trânsito Caótico (Maria Teresa Vieira), Lá Vai a Noiva (CEDIM E SESC Nova Iguaçu). 2011 - Salve São Jorge - CAZA (RJ), Cor de Rosa Choque (Zona Oculta) - CEDIM (RJ). 2010 - Participou como artista convidada da exposição da fotografa Cristina Oldemburg - Chácara do Céu (RJ), Imaginário Periférico – Projeto Mola (Circo Voador) (RJ). 2008 - Museu do Retrato (Recife, PE). 2004 - Poematrix - Dama de Ferro (RJ), Vestível - Imaginário Periférico (Friburgo, RJ). 2003 - Banheiro de Portas Abertas - Dama de Ferro (RJ). 2001 - Xavenas (Lisboa, Portugal), Linguagem - Espaço Cultural Antônio Bernardo (RJ), Salão da Primavera (Resende, RJ). 2000/2001 - Jardinvenção I, II e III - Evento no Jardim de Alah (RJ). 1998/2001 - Univercidarte - Estácio de Sá (RJ).

. Nome Completo:
Claudia Chonchol Dowek
. Nome Artístico: Claudia Dowek


Sobre o Trabalho

Mesclando o universo rural ao urbano e a delicadeza da renda à aspereza da terra, tramo telas banhadas pela poética do conflito. Dentre suas múltiplas dimensões, a mais intrigante é a do tempo, que confunde a percepção do espectador. Paralelamente, seu forte caráter arquetípico nos projeta a uma dimensão quente e acolhedora, confrontando-nos com experiências pessoais. Plasticamente, a terra expõe a superfície mais fina e suscetível da pele. “Flores de Pedra” transbordam entre rachaduras, expondo a essência oxidada. Em outro plano, uma camada onírica projeta nas sombras memórias felizes. A tela como caixa, vela e desvela entre fendas nosso Ente original.

Explorada em múltiplos sentidos, a tela deixa de ser plana. A manufatura é executada em técnica mista, onde minérios e resinas oscilam entre tinta e matéria escultórea. A partir de uma profunda pesquisa de antropologia cultural, fitas são tramadas, escamas bordadas e rendas tecidas, revelando as cores e as texturas do motivo narrado.

Reverenciando a linguagem matérica presente em Anselm Kiefer e Nuno Ramos e a ausência dela em Armando Reverón, pesquiso a força da percepção, presente na interatividade de Lygia Clark. Dessa confluência, o que resulta são trabalhos  recheados de histórias e conteúdo estético.



“Névoa Baixa, Sol que Racha” Quase um Prelúdio
Por Paulo KLEIN*

“- Bom bom-dia, minha gente. - Bom dia para os presentes. - Bom dia, futuramente. - Bom dia ainda, no ventre.
As mulheres de descascar
- Bom dia tem que dizer
Quem chega a todo presente.
Dizer bom dia é como
Tirar o chapéu, compridamente.
- Bom dia não antecipa o dia que espera em frente. - Nem bom-dia tem a ver se é sol ou chuvadamente”.
1

‘Não existe caminho, se faz o caminho ao caminhar’2. Debaixo do sol a pino, sevada em poesia e ao som da cantoria de Elomar Figueira de Melo - bardo errante Das Barrancas do Rio Gavião - a artista Claudia Dowek constrói seu original caminho, perde-se e perde-nos muitas vezes para reencontrar-se e reencontrar-nos nas veredas intangíveis das Artes. Ela derrama-se, como um rio de serenidade, nesta Névoa baixa, sol que racha, estação de devaneios e reflexões e onde reencontramos sua arte e a arte/vida de mulheres guerreiras, heroínas dos grotões destes brasis profundos.

Imagens e histórias que aderem à nossa memória apesar das distâncias, mãos calejadas pelo trabalho bruto que sonham com a delicadeza dos contos de fadas, mesmo quando usam calças masculinas sob o vestido encardido, botina e foice. Isso quando a realidade não planta pés duros no chão áspero e poeirento, esta saga de Marias, Severinas, Josefas, Marianas, tantas ‘Anas’, tantas filhas, mães, companheiras de gozos e desconsolos.

Claudia Dowek desce da carroceria dos caminhões das ‘boias frias’, caminha no chão batido dos terreiros, nas agruras das roças com essa experiência/reflexão transmídias para produzir esta exibição que resgata os interiores do humano em cores preciosas, têmpera e alquimias minerais.

Dizer que Claudia Dowek homenageia estas mulheres guerreiras é um mote, quase preâmbulo. Ela penetra, com propriedade e obstinação raras, nestes meandros de martírios, dúvidas e sofrimentos para extrair dali o Belo, que brota em camadas terrosas, óxidos de ferro, especularita, filito e pigmentos minerais recolhidos em viagens à Itabirito, Minas Gerais - onde esteve inicialmente com o artista Xico Chaves, com quem trabalhou -, cenário este imortalizado por Franz Krajcberg, entre 1964 e 1971, quando viveu e criou ao pé do Pico de Cata Branca.

Claudia Dowek apresenta em Névoa baixa, sol que racha obras que brotam como caminhos que se bifurcam e transbordam em muitos outros caminhos. Num dos ambientes, apresenta seis quadros que mantêm conexão com técnicas e linguagens tradicionais, com sua fidelidade à pintura, que lhe é preciosa, mas aberta a ousadias, a ponto de aceitar a utilização de rendas e vazados que permitem um jogo de sombras, relevos, provocações que dialogam com a matéria pintada com os pigmentos de Itabirito. Ela agrega a este fazer da práxis experimental, deriva à sua maneira dos procedimentos da arte matérica e dos suprematistas, reelaborando novas possibilidades para o resistente e duradouro ato de pintar.

Neste conjunto de quadros - porque eles ainda o são, apesar das rupturas - resgata a esquadria sertaneja, a gambiarra que insinua elegância na transparência das rendas, estrutura exposta em contraponto com os momentos históricos da ‘arte objeto’, da ousadia do corte na tela de Lucio Fontana, do corte que expõe vísceras na obra de Adriana Varejão, no corte ‘a palo seco’ de que fala Cabral – ‘a palo seco é só a lâmina da voz / sem a arma do braço / sem tempero ou ajuda/ tem de abrir o silêncio/ com sua chama nua3’.

Este processo de estudos, pesquisas e transpirações resultou neste atual manifesto que ela nomeou ‘Som da Gente’, título retirado de conversas (história oral) colhidas com mulheres de zonas rurais da Bahia, em que falavam sobre serem ou não ouvidas em suas ‘próprias vozes’. Sob este signo, criou três telas e a videoinstalação, que estimula sensações por outras vertentes ao recuperar a atmosfera destes lugares longínquos da vida rural, em contraponto com o movimento acelerado da urbe nervosa.

Claudia reflete em sua produção atual este embate rusticidade/delicadeza ao equilibrar a massa crômica, embasada em barro e minerais (óxidos férreos), com a fragilidade oprimida das rendas, com seus pontos de lembranças reminiscentes - frivolité, filé, renascença. Resgata de forma sutil e comovente tradições enraizadas no seio destas mulheres laboriosas que, sem abandonar as ferramentas do trabalho pesado, levantam a bandeira do lirismo através da música, da dança e da poesia dos bordados. Ela agrega ao seu processo criativo, deste modo, dados referenciais da antropologia social, adensando com alta carga humanitária a frieza que hoje ostenta certa produção dita contemporânea, num modo muito próprio de atuar que já foi definido como ‘poética dos conflitos’.

Três obras desta série (‘Som da Gente’) ganharam nomes de mulheres engajadas na luta pelos direitos das mulheres no Brasil: Margarida Alves, assassinada há 30 anos, símbolo da luta da mulher no campo, pioneira na luta pelos direitos trabalhistas na Paraíba; Nazaré Flor, poeta da Zona Rural que participa dos movimentos pela reforma agrária; e Maria Dolores, doutora pela Universidade Federal do Ceará, que se dedica à causa das mulheres campesinas.

As outras peças deste conjunto - Airequecê (Lua), Pituna (Noite) e Prelúdio – provém de séries anteriores e conservam o mesmo rigor na busca do ponto certo para sua Pintura, comprometida com as técnicas e com a forma, mas aberta à interação com outros elementos: rendas, fios de cobre e juta, resinas, pigmentos brutos e sal de frutas.

As rendas aplicadas em seu trabalho são originalmente confeccionadas por mulheres rendeiras de Orobó e Pesqueira, interior de Pernambuco. As rendas douradas, inseridas em Prelúdio, foram obtidas por oxidação, opção na qual buscou tanto a plasticidade ideal, como a pauta do valor, muitas vezes ignorado, destas artesãs.

A videoinstalação cria no ambiente da galeria a atmosfera bucólica da vida sertaneja, em conflito com a condição urbana, partindo de imagens que remetem a estes mundos através de uma estrutura que utiliza bambu, pau a pique, fitas e sonoridades que remetem ao antagonismo destes universos.

Claudia Dowek desperta em nós, com seu talento e senso crítico, percepções diversas. Transporta-nos ao centro de seu discurso de revelações e construções poéticas, que flutuam entre o popular e o mundo velado da Arte Contemporânea. Para operar essa engenharia de sensações, disposta nesta ocasião especial, Dowek frequentou inúmeros cursos e museus do Brasil e do mundo, mas também territórios populares e salões sofisticados; recolheu histórias de vida e pigmentos minerais, leu poemas ingênuos, canções de trabalho e de folia, estudou História da Arte, Técnicas de Pintura, mas também a História e as Técnicas do Crochê e dos Bordados. Da tessitura da palha ao balanço das redes, agregou tudo à sua maneira particular de fazer arte como arquitetura de um porvir justo, harmonioso, alquimia do (im)possível, construção de um universo de afetos através dos fazeres do mais simples cotidiano.

1. CABRAL DE MELO NETO, João. ‘A Casa de Farinha’ (obra manuscrita do poeta, confiada por ele com à sua filha Inez Cabral), lançamento previsto para este ano de 2013 pela Editora Alfaguara.
2. MACHADO Y RUIZ, Antonio. Adaptação livre do verso “Caminhante não há caminho, se faz caminho ao andar”.
3. CABRAL DE MELO NETO, João . Obra Completa – Editora Nova Aguilar – 1994.


*Paulo KLEIN é escritor e crítico de Artes Visuais, membro da ABCA – Associação Brasileira de Críticos de Arte e da AICA – Association Internationale Des Critiques D’Art.




Entrevista para o site arteseanp.blogspot.com.br

Quem é Claudia Dowek?
Sou artista visual, carioca, uma ariana de 38 anos (nascida em 1974). Sou formada em Design Gráfico, estudei também moda no Senac e fiz  pós em “Arte e Filosofia” na PUC-RJ, além disso possuo uma ampla formação em artes visuais, embasada por diversos cursos práticos e teóricos. Arte sempre foi o principal interesse da minha vida e para onde a minha energia me levou. Em busca de uma maior compreensão desse universo, trabalhei numa galeria e posteriormente no Museu Nacional de Belas Artes, onde aprendi muito como assistente do então atual Curador Xico Chaves. Atualmente trabalho no meu atelier, no Horto (RJ), onde embasada em muitas pesquisas e colocando a mão na massa, desenvolvo meu trabalho.

Quando você começou a se interessar pela arte?
Na minha mais antiga lembrança de infância, estou empunhando um pincel e pintando naqueles caderninhos de colorir. É como se o ato de pintar fizesse parte da minha vida e da minha alma. Apesar de hoje meu trabalho estar se misturando ao 3D e a multimídia, sempre me auto-intitulei pintora. O interesse pela arte em si, fluiu paralelamente ao interesse em fazer arte.

Qual foi sua formação artistica?
Estudei teoria e prática artísticas com diversos professores. Considero uma ampla formação, tanto no conhecimento da história, filosofia e conceito quanto na manufatura, fundamentais. Isso me permitiu, a partir de diversas experimentações, ir de encontro a minha linguagem!

Que artista influenciaram seu pensamento?

Na minha compreensão, todo o referencial de uma vida, estudando e admirando a obra de diversos artistas influenciaram meu pensamento. Posso somente citar alguns que têm me interessado nos últimos anos, como a linguagem matérica, presente em Anselm Kiefer e Nuno Ramos e a ausência dela em Armando Reverón, desconstruindo a imagem.  A Anarquia de Arman e a poesia nas sombras ampliadas, projetadas por velas, de Christian Boltanski, sem esquecer logicamente seu intuito político. A crueza de Artur Zmijewski nas suas denúncias. Um incrível pintor chinês chamado Liu Ya Ming e as esculturas esboçadas de Thomas Houseago, entre tantos outros. Além disso, sou tremendamente influenciada pela riqueza estética da cultura popular. Suas danças e músicas, artesania e rendas completam a minha pesquisa.

Como você descreve seu trabalho?
Comecei a desenvolver minha atual linguagem a partir de minérios garimpados na região de Itabirito, material que havia recolhido em uma viagem feita muitos anos antes. Outros materiais foram se juntando a pesquisa, alguns encontrados em andanças, alguns sugeridos e outros que chegavam a mim em forma de presentes. Tudo isso mesclado a um crescente interesse em antropologia e regionalismo. Os trabalhos são construídos como uma assemblage de matérias e superfícies. Rendas, conchas e fibras tem o intuito de traçar a estética de comunidades tradicionais, além de suas manifestações culturais. Resultando em telas de forte caráter arquetípico e impregnadas pela estética do conflito. Nelas o universo rural se mescla ao urbano e a delicadeza da renda confronta a aspereza da terra. Dentre suas múltiplas dimensões, a mais intrigante é a do tempo, que confunde a percepção do espectador. Com o desenvolvimento da linguagem, a preocupação narrativa foi diminuindo e a política, que já existia, florescendo, a partir de considerações sobre o pouco valor dado as nossas origens culturais e, sobretudo aos que a perpetuam. Atualmente o trabalho está ganhando cada vez mais tridimensionalidade e a entrada de outras mídias. Tenho três individuais marcadas para 2013. Em outubro, no Centro Cultural da Justiça Federal do Rio de Janeiro, pretendo apresentar uma instalação composta por uma série de objetos e um vídeo, além de algumas telas.

É possível viver só de arte no Brasil?
Se estivermos falando de viver de arte a partir da venda de trabalhos e encomenda de projetos, sem dar aulas ou realizar outro ofício paralelo, isso é para poucos! O que facilita um pouco é o mercado internacional. Mas tudo isso vem mudando muito nos últimos anos, talvez por ser o Brasil a “bola da vez”, a nossa cultura está sendo olhada de outra forma, inclusive pelos próprios brasileiros. Vamos ver...

O que você estuda? Como você se atualiza?
Estudo assuntos diversos, que permitam acrescentar ao meu trabalho e ao meu crescimento pessoal. Afinal compreendo que a maturidade da expressão depende da minha integridade como um todo. Além disso, realizo viagens em busca do conteúdo que irão preencher as lacunas da minha obra, como alguns materiais e pesquisas das manifestações culturais e do cotidiano dentro das comunidades tradicionais.

Qual sua opinião sobre os salões de arte? Alguma sugestão para aprimorá-los?
Considero a avaliação de um “Salão” ou “Edital” um pouco confusa. Afinal, como realmente avaliar o trabalho de um artista sem conhecer seu histórico? Além disso, mais do que seguir uma linha, alguns são tremendamente tendenciosos.

O que é necessário para se tornar um ícone em artes plásticas?
Estou tentando descobrir! O caminho que busco seguir é o de galgar cada degrau, sem atropelar nenhuma etapa do processo.

Que dificuldades encontra um jovem artista para ser representado por uma galeria?
O artista precisa despertar o interesse, além de merecer a confiança de um galerista que decida investir no seu trabalho. Existe muita concorrência e muitas vezes é necessária uma indicação, para que seu trabalho ao menos seja olhado.

Quais são seus planos para o futuro próximo e distante? Fale dos seus sonhos: Bienal, mercado internacional...
Acho que gostaria de expor na China, em Berlim. De imediato, gostaria de entrar no mercado de São Paulo. Fui selecionada em diversos editais de exposição pelo país, mas não lá! Além disso, espero vir a trabalhar com um galerista Londrino que vem me acompanhando. Ele me traçou muitos elogios, mas só trabalha com artistas com currículos bem maiores que o meu, então estou me esforçando para chegar lá!

Como você aproveita o seu tempo livre?
Adoro atividades ao ar livre como caminhar, ir a praia, cachoeiras. Outra coisa que me deixa muito feliz é viajar. Entrar no carro, pegar a estrada e ver a paisagem e as pessoas mudando é mágico! Como não poderia deixar de ser, também gosto muito das atividades culturais, exposições, um bom filme, boa música... Mas, no momento tenho dedicado muito do meu tempo livre ao Gustav Klimt que ganhei de Natal. Um lindo filhotinho de Border Collie. Em vez de “O Beijo”, ganhei muitas lambidas!




A Tela, a Terra e o Murmúrio (Clarisse Fukelman)

Não há limite entre as artes. É o que Claudia Dowek parece dizer com suas telas escultóricas. Promovendo o diálogo múltiplo de matérias e formas e o permanente exercício de experimentação, por mais de uma década a artista decanta as forças humanas originárias, primitivas – dança, onírico, pré-linguagem, usando técnicas e temas diversos.

Na série Nação Jongo a inquietação se depura, fica mais corpórea. O processo envolve ingredientes da flora e do artesanato brasileiros, estimulando a percepção sensorial. O resultado é a fusão dos sentidos: o que se vê é o que se toca. As folhas e as rendas, aplicadas e mescladas ao pigmento e à resina, são rendas em folhas e também folhas de renda. Visão e tato atraem o espectador na fruição de obras que mesclam objetos (palha, conchas) e desejo: tocar a origem da arte e invocar a comunhão homem/ natureza.

A recusa da forma acabada também instala movimento e tempo, na cena pictórica. Propositalmente, a artista expõe o seu fazer. Faz ver a pressão do braço, os volteios da mão organizando relevos, volumes, tonalidades do branco. A fisicalidade comanda a construção de seu universo visual. O relevo e a escultura intrometem-se na planície do quadro. Uma tensão eclode da terra rachada enquanto contornos traçam, por gestalt, rostos, mapas, rios.

Nessa atitude podem-se sondar genealogias e interlocuções: Lygia Clarck, Helio Oiticica, Nuno Ramos, Armando Reveron, Anselm Kiefer. Artistas do tridimensional, artistas que testam e misturam materiais, artistas que aproximam culturas.

Claudia Dowek soube identificar no Brasil o terreno ideal para a escuta de outros lugares e tempos. O elo com a ancestralidade da arte se dá em vários níveis. A busca é arqueológica e cinética. Claudia se desloca, viaja, põe o pé no chão e na massa. O ato de criação tem início com a coleta de materiais, o que mobiliza a artista no corpo e no espírito. Daí compor quadros como quem constrói a casa a partir do barro: um lote de tijolos, um quilo de sol e um projeto de renovação de linguagem.  O entalhe e a pedra das primeiras manifestações de arte murmuram sob suas modelagens e seu barro.  É memória.

Há também o ânimo antropológico, no reencontro com a formação cultural brasileira: jongo, ciranda, cantoria. Em obras como Louvação, por exemplo, a escavação acontece em território banto. Dowek traz a taboa do Quilombo do Campinho; a concha do Quilombo de Mandira; resíduos das minas férreas de Ouro Preto.

No plano propriamente estético, concilia densidade e leveza e aproxima palavra e imagem, dialogando com tradições antigas e atuais (hieróglifos, grafite, processo escritural da arte contemporânea). Mas a artista se distingue ao encampar o sentido das palavras. Letras e frases, nela, são formas e são sentidos, símbolos gráficos e mensagens. Falas que formam a nossa vida, mesmo que inconscientemente. No todo, observa-se a organicidade “que une, subterraneamente, todos  fragmentos do heterogêneo”, a “conjunção nova com elementos do passado”, como diria Maffesoli. 

Numa retrospectiva, as primeiras obras já indicam esse filtro do real pela ótica da pulsão. De modo sutil, sugestivo. Eros e Tánatos confrontam-se camufladamente, o que intensifica a potência dramática das criações. Esteticamente, o vigor subterrâneo surge na diluição de formas, nas sombras, no flagrante do pânico no centro das pupilas do rosto minimamente esboçado (quadro Cheirando cola 2). Ou, ainda, no vermelho que cobre a tela, misto difuso de paixão, apelo e sofrimento (série Balanço de 98).

Disso tudo: Claudia Dowek apresenta um olhar peculiar, no contexto de outras produções contemporâneas. Ela “ciranda”. Vai além da sobreposição de materiais. Ela funde plano e profundidade, popular e erudito. Tudo se integra, graças a uma argamassa feminina, para além da terra – na tela, no entredito, na caligrafia, no vermelho escuro da memória.



Comentários

“Claudia Dowek experimenta as possibilidades da superfície  de vários modos diferentes, desde de rendilhados, asperezas e vazados para sugerir outras superfícies imaginárias e misteriosas que estão aí postas para cada um de nós investigar, e talvez decifrar.”

Luiz Aquila


Com obras que fixam o olhar e aguçam a curiosidade do observador, Claudia Dowek apresenta em sua nova série pinturas confeccionadas com pigmentos naturais (terras e pedras moídas), onde a rusticidade confronta a delicadeza de rendas, palhas e outros objetos garimpados em comunidades ribeirinhas, caiçaras e quilombolas. Suas obras tem cor de terra, numa variada pigmentação. Com maestria a artista manipula o material, compondo suas pinturas cheias de relevos e veios, em sutil tridimensionalidade carregada de histórias.

Paulo Branquinho - Produtor de Arte